-->

sábado, 18 de maio de 2019

18 de maio – Dia Nacional da Luta Antimanicomial A Luta não pode parar! - Texto: Drª Denise Câmara de Freitas - Psicóloga

Denise C. de Freitas trabalha na Apae Aperibé e na Pref. de Itaocara
Afinal, pelo que lutamos? O que é mesmo a Loucura? E onde estaria ela?

O Movimento Antimanicomial refere-se à luta pelos direitos de todas as pessoas com sofrimento mental. Essa luta se caracteriza pelo combate à ideia de que se deve isolar a pessoa, escondê-la, em nome de pretensos tratamentos, que nada mais são do que meios de segregação baseados nos preconceitos e estigmas que cercam a doença mental.

A Luta Antimanicomial nasceu a partir da Reforma Psiquiátrica que ocorria no final da década de 70, em pleno processo de redemocratização do país, mas foi em 18 de maio de 1987 que a luta ganhou forma a partir do Encontro dos Trabalhadores da Saúde Mental, em Bauru/SP e a I Conferência Nacional de Saúde Mental, ocorrida em Brasília. Tendo por tema: “Por uma Sociedade sem Manicômios”, diferentes categorias profissionais, associações de usuários e familiares, instituições acadêmicas, representações políticas e outros segmentos da sociedade deram voz ao movimento e questionaram o modelo clássico de assistência baseado em internações em hospitais psiquiátricos e denunciaram as graves violações aos direitos das pessoas em sofrimento psíquico que se tornaram vítimas das mais diversas atrocidades dissimuladas em atendimento.

Temos como exemplo o cenário sombrio da história recente do Hospital Colônia de Barbacena (MG), conhecido também como o Holocausto Brasileiro, onde as estimativas apontam mais de 60 mil óbitos decorrentes de maus-tratos. Essa instituição, fundada em 1903, era formada por diversos prédios e pavilhões, e cada um deles tinha uma especialidade, sendo que 70% dos casos encaminhados não tinham nenhum diagnóstico mental, eram, em sua maioria, alcoólatras, homossexuais, prostitutas, viciados em drogas, e mendigos. Os indesejados pela sociedade. 

No Manicômio de Barbacena, crianças recebiam o mesmo tratamento que adultos e os tratamentos funcionavam à base da tortura: utilizavam cadeiras elétricas, solitárias e camisas de força. Os pacientes eram submetidos à situações precárias de sobrevivência, como fome e sede extremas. Em alguns casos, chegavam a beber a própria urina. Nos pátios, viviam nus e em meio a ratos e baratas; urinavam e defecavam no chão. Muitas pessoas eram colocadas no Manicômio de Barbacena pela própria família. Era o caso de mulheres indesejadas pelos maridos e parentes que tinham algum tipo de deficiência, transtorno ou distúrbio, como Síndrome de Down, Autismo e Dislexia. 

Com o intuito de acabar com os manicômios, o Encontro de Bauru e a Conferência de Brasília produziram o projeto de Reforma Psiquiátrica no Brasil que visava substituir, aos poucos, o tratamento dado até então por serviços comunitários. O paciente seria encorajado a um exercício maior de cidadania, fortalecendo seus vínculos familiares e sociais, e nunca sendo isolado destes. A partir da Reforma, o Estado não poderia construir e nem mesmo contratar serviços de hospitais psiquiátricos. Em substituição às internações, os pacientes teriam acesso a atendimentos psicológicos, atividades alternativas de lazer e tratamentos menos invasivos do que aqueles que eram dados. A família, aqui, teria papel fundamental na recuperação do paciente, sendo a principal responsável por ele.

O Movimento de Luta Antimanicomial consistiu em um diálogo de conscientização com as instituições legais e com os cidadãos ao elaborar o discurso de que os portadores de transtornos mentais não representam ameaça ou risco ao círculo social. Ao contrário, este seria um grande componente para sua recuperação. 

Por outro lado, seria necessário uma reeducação no modo de compreender os transtornos mentais, não como um estigma, mas como um modo alternativo de ver e estar no mundo. O respeito e a conscientização seriam armas necessárias para reformular o modo como os pacientes eram conduzidos até aquele momento, dentro e fora de instituições responsáveis pelo tratamento.

Em 1992 criam-se os CAPS – Centro de Atenção Psicossocial, que surgem a partir desta perspectiva da Reforma. Trata-se de serviços públicos disponíveis em unidades regionais, que oferecem atendimentos diários com objetivo de reinserir o paciente na sociedade. Havendo necessidade de internação, é o próprio CAPS que encaminha o paciente para leitos de saúde mental em hospitais gerais que oferecem internação de curto prazo. Esses serviços de internação fazem parte da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que têm como função substituir a internação em asilos, priorizando um tratamento que visa a autonomia do paciente e o respeito à cidadania. 

Fruto do movimento pelo fim das internações compulsórias, o CAPS tem como ferramentas o atendimento individualizado, com rodas de conversa, oficinas artísticas e o tratamento terapêutico individual e em grupo. Busca-se oferecer um tratamento ambulatorial mais humanizado, no lugar de hospitais psiquiátricos e longas internações.

Em 30 anos, leis para promover a reforma psiquiátrica foram promulgadas por Municípios, Estados e também pela União. Mas, no dia 14 de dezembro de 2017, voltamos algumas décadas no tempo. O Brasil foi surpreendido pela aprovação de nova Política de Saúde Mental pela Comissão Intergestores Tripartite (CIT), instância composta pelas três esferas de gestão da saúde no país – União, Estados e Municípios –, sem a participação da Sociedade Civil. 

Na sessão, o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS) sequer teve garantido seu direito à manifestação, ferindo a prerrogativa do controle social. A mudança da política imposta pelo Ministério da Saúde resultará em impactos negativos aos cuidados em saúde mental dos usuários. Com o retorno de manicômios e o fortalecimento das comunidades terapêuticas – históricos espaços de segregação e exclusão – o estigma da doença mental voltará a assombrar os usuários. Além disso, os serviços comunitários, como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), os Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs) e outros espaços da Raps tenderão a se enfraquecer, coagidos pela pressão para internações psiquiátricas. 

Por isso o dia 18 de Maio – Dia Nacional da Luta Antimanicomial – é uma data crucial para legitimar mais de três décadas de luta pelo direito das/os usuárias/os de saúde mental por atendimento digno, respeitoso, qualificado e inserido na sociedade. Afinal, pelo que lutamos? Lutamos para lembrar que, como todo cidadão, estas pessoas têm o direito fundamental à liberdade, o direito a viver em sociedade, além do direto a receber cuidado e tratamento sem que para isto tenham que abrir mão de seu lugar de cidadãos. O que é mesmo a Loucura? E onde estaria ela? 

Loucura é olhar para trás e ver o rastro de preconceito e sofrimento que mancharam a nossa história e ameaçam o futuro destas mesmas pessoas que por muitos anos foram vistas como os indesejáveis, os “a-normais” e por não haver lugar para elas, foram excluídas, isoladas, escondidas e silenciadas pela sociedade. Loucura é não aceita-los. Loucura é não entendê-los. Loucura é o PRECONCEITO. Onde ele está?

Fontes:
Abrasco.com.br – Luta Antimanicomial Archives - ABRASCO
Assdevoltaparacasa.org.br – Associação de Volta para Casa – Movimento da luta Antimanicomial
Aventurasnahistoria.uol.com.br – Manicômio de Barbacena: O Holocausto Brasileiro que matou 60 mil pessoas
Justificando.com – Arquivos Luta Antimanicomial
Saude.gov.br – 18/05 Dia Nacional da Luta Antimanicomial
Saúde.abril.com.br – Saúde Mental: o Brasil voltou 30 anos no tempo
Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Carlinhos Barrias - Bar dos Amigos

 


PARCEIRO


Studio Fênix - Visite


Itaocara Seguros

Core Contabilidade



Postagens mais visitadas

Arquivo do blog

Referências

Unordered List

Support