Em reconhecimento a vida dedicada ao município, a Câmara de ITAOCARA, por iniciativa do Vereador Jaderson Aleixo, aprovação
unanime dos demais Vereadores e sanção do Poder Executivo, denominou o trecho
de rua que vai do Banco Itaú até o final da via, de Vice Prefeito José Maria
Fernandes. Para as novas gerações, que não tiveram o privilégio de conhecer
esse GIGANTE da nossa Aldeia da Pedra, a Nova Voz On Line traz hoje um bate papo com os filhos de
José Maria, Bethânia e Cássio, noutro registro histórico para ser guardado e
entrar na posteridade.
José Maria Fernandes recebeu merecida homenagem |
Nova
Voz On Line
– Como vocês, Bethânia e Cássio, receberam a notícia de que a rua onde seu pai
fundou a Core Contabilidade e passou boa parte da vida, trabalhando em prol de
uma Itaocara melhor, tem, a partir de agora, o nome dele?
Bethânia
e Cássio
- Ficamos
muito contentes e emocionados com a decisão da Câmara de Vereadores de
Itaocara, por iniciativa do Vereador Jaderson Aleixo. Queremos demonstrar nossa
gratidão ao poder público do município por esse reconhecimento que nos honra
muito. E mais ainda por se tratar de um espaço da cidade onde nosso pai
desenvolveu parte fundamental de sua vida por quarenta anos. Essa que sempre
foi, para nós, a “rua do escritório”, onde ele desenvolveu seu trabalho
cotidianamente em todos esses anos, agora passa ser a rua dele, com o nome
dele. É uma homenagem muito bonita.
Nova
Voz On Line
– O José Maria Fernandes sempre teve uma paixão enorme por Itaocara. Nunca
poupou nada, quando o interesse era o município. Sabemos que muitas vezes a
própria família ficou com saudades dele, por estar viajando ou mesmo em
Itaocara, mas cuidando de interesses da cidade. Agora receber essa homenagem,
da Câmara de Itaocara, a partir da iniciativa do Vereador Jaderson Aleixo, de
certa forma acalenta o coração de vocês?
Bethânia
e Cássio
- Certamente
essa iniciativa nos acalenta o coração e abranda a falta que a ausência dele
nos traz. Itaocara era o centro de sua vida, e de um modo profundamente
político. Sua atuação política se realizava tanto no contexto interno do
município, como dirigente de partido e atuante em todas as frentes da política
local, quanto no cenário regional e estadual, na busca por incluir Itaocara nas
discussões sobre a integração do noroeste fluminense. Então, isso demandava um
trabalho cotidiano de reuniões na cidade, por todo o estado do Rio e, às vezes,
em Brasília, quando foi Delegado Nacional do PMDB. Desde a nossa infância
tivemos que compreender que a atividade política que exercia nos roubava um
pouco do tempo de convívio com ele. Por outro lado, o sentido da atividade
pública foi um valor que esteve presente na nossa formação, o que, acreditamos,
representou um ganho que pudemos ter. O valor que ele dava à política,
compreendida como a tarefa mais importante do homem, é um aprendizado que
tivemos e que certamente marca nossa personalidade e nossa compreensão do
mundo.
Bethânia Fernandes no dia que a CMI aprovou projeto do Vereador Jaderson Aleixo, criando a Rua Vice Prefeito José Maria Fernandes |
Nova
Voz On Line
– Se dirigindo as novas gerações podem contar um pouco, da perspectiva de
filhos, quem foi e sobre o trabalho que José Maria Fernandes escreveu com a
própria vida, por Itaocara?
Bethânia
e Cássio
- Nosso
pai descende de uma família simples, de nove filhos, originária de uma pequena
cidade na Zona da Mata de Minas, depois transferida para Santo Antônio de
Pádua. Começou a trabalhar aos 12 anos de idade, separando café numa torrefação
em Pádua. Aos 13 anos, ingressou no cargo de contínuo, num escritório de
contabilidade, atividade que desenvolveu paralelamente aos estudos contábeis.
Transferiu-se, na metade dos anos 60, para Itaocara, para administrar, em sociedade com José Romar Lessa, o
Core Contabilidade. Como nosso avô materno morreu muito novo, nossa mãe herdou
parte de uma pequena fazenda em São José de Ubá. Nosso pai, então, assumiu
também a tarefa de administração dessa propriedade rural, que passou a ser sua
atividade de todos os sábados.
Nova Voz On Line – Com ele começou a participar da política?
Bethânia
e Cássio
- Ele
entrou para a política na década de 70, tornando-se Chefe de Gabinete do então
prefeito, Joaquim Monteiro. Dali em diante, a política passou a ser sua
atividade principal, logo sendo eleito Vice-Prefeito na chapa em parceira com
José Romar Lessa. Sua atuação política teve, então, início ainda no período do
Regime Militar. Ele é fundador do Movimento Democrático Brasileiro em Itaocara,
portanto o partido de oposição à Ditadura Militar. O “velho MDB de guerra”,
como era chamado, integrava todas as forças que lutaram contra a ditadura e
promoveram o processo de redemocratização no Brasil nos anos 80. Depois, com o
fim da ditadura, o partido passou a se chamar PMDB.
Nova Voz On Line – Ele teve grande destaque no MDB, depois PMDB do Rio, não é
mesmo?
Bethânia
e Cássio
- Ele
participou, em nível regional, da campanha pelas eleições diretas. Foi
encontrar Tancredo Neves em Belo Horizonte. Tancredo foi o primeiro presidente
não militar depois do Golpe de 1964. Nosso pai, com o grupo de companheiros de
Itaocara, esteve forte na campanha pela eleição (ainda indireta) de Tancredo
Neves. Em seguida, ele e os amigos choraram juntos a morte de Tancredo, antes
de assumir a presidência. Temos presente esta imagem: nosso pai e os amigos
chorando diante da televisão, enquanto o cortejo fúnebre de Trancredo Neves
desfilada pelas ruas históricas de São João del Rei. Então, o PMDB foi sempre o
partido dele, sendo por anos presidente da legenda em Itaocara. Quando adoeceu,
em 2003, ainda estava nesse cargo.
José Maria, com um dos seus grandes amigos, o Jornalista Ronald Thompson, Editor da Nova Voz On Line, na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, Representando Itaocara no Leilão da UHE Itaocara, em 1997 |
Nova Voz On Line – O que ele falava sobre suas ideias para Itaocara?
Bethânia
e Cássio
- Ele
tinha um projeto político e trabalhou sempre para realizá-lo. O projeto
consistia em integrar Itaocara no cenário político estadual e, com isso,
promover o desenvolvimento da cidade. Ele pensava do ponto de vista regional.
Assim, defendia que o noroeste fluminense deveria se constituir como uma força
política unitária, que possibilitasse uma maior integração econômica, visto que
se trata de uma micro-região com potencialidades e problemas compartilhados por
todos os municípios que a compõem.
Nova Voz On Line – Que interessante!
Bethânia
e Cássio
- Sua
meta era a integração regional e seu fortalecimento político. Ele pensava numa
administração estadual descentralizada, formada por sub-governadorias, dentre
as quais a do noroeste do estado. Por isso sua ação política não se restringia
ao município. Ele estava sempre em reuniões em Pádua, em Itaperuna, no Rio de
Janeiro, sempre procurando formar esse consórcio político do noroeste
fluminense. Quando foi Secretário de Fazenda de Itaocara (exerceu essa função
por 8 anos), criou o fórum do noroeste fluminense dos secretários da pasta.
Reunia-se periodicamente com os demais secretários de fazenda da região
exatamente para pensar em alternativas econômicas em caráter regional. Não sabemos
se esse fórum ainda existe, nem se esse projeto de integração regional foi
levado adiante. Era uma iniciativa importante e inovadora na época.
Nova
Voz On Line
– E como era o José Maria como Pai? O que os dois teriam a nos dizer?
Cássio - Ele tinha,
antes de tudo, uma personalidade democrática. Embora fosse político atuante, nunca
me pediu para me filiar a nenhum partido; era maçom, mas nunca me pediu para
participar da Maçonaria. Não que eu tivesse algo contra o partido dele ou à
Maçonaria; muito ao contrário. Mas, ele não queria interferir nas minhas
decisões, sempre me deu liberdade de escolha.
Nova Voz On Line – Ele dava total liberdade, não é mesmo?
Cássio - Quando
abandonei o curso de Agronomia na UFRRJ para estudar Sociologia na UFF, não ouvi
dele nenhuma repreensão sobre minha escolha, ainda que a carreira de Sociologia
apresentasse dificuldades de colocação muito maiores, e certamente ele tinha
preocupação com relação a isso. Era um democrata no sentido mais profundo:
democrata dentro de casa. Esse é um valor que eu tento carregar na educação de
meus filhos. E é uma coisa que ele me ensinou naturalmente, porque era assim
que entendia a relação com os filhos, como também assim entendia a política. E
tinha o prazer do convívio. Em casa, sempre queria compartilhar um bom prato.
Era parceiro do copo de vinho e de uísque, sempre interessado na conversa.
Afinal, a política é a arte da conversa.
O Vereador Jaderson Aleixo é o autor do projeto que criou a Rua Vice Prefeito José Maria Fernandes, aprovado pela Câmara de Vereadores |
Nova
Voz On Line
– Para ilustrar, pode contar uma história que viveu com ele,
ou uma mania que ele tinha, algo assim, só para as pessoas saberem como era o
José Maria no dia a dia?
Cássio – Meu pai
era muito ativo, dormia pouco, trabalhava, atuava na política e era
perfeccionista. Queria que tudo desse sempre certo. Então, fazia uma coisa, se
não gostasse do resultado, refazia uma, duas vezes, até se contentar. Para
suprir a deficiência das horas de sono noturno, dormia por pequenos períodos no
meio do dia, sempre que era possível. Isto numa cadeira do barbeiro; numa viagem
curta com motorista; por meia hora, em casa, entre uma reunião e outra. E eu,
quando estava em Itaocara, andava com ele para todo lado; era o seu motorista.
Uma vez, numa viagem a Carmo e Sumidouro, para onde ia se encontrar com
políticos locais, ele aproveitou para dar uma cochilada enquanto eu seguia ao
volante. Foi quando percebi que ele, dormindo, fazia os gestos de que estivesse
dirigindo o carro. De repente, ele acordou assustado e me disse: “Ah, você é
que está dirigindo. Ainda bem.” E dormiu de novo.
Bethânia - Lembro que nessa viagem encontramos um
político tradicional de Carmo, uma figura, de fato, que nunca saiu de minha
memória: Aprígio Ramos Alves, que era um narrador espetacular, um grande
contador de história. E foi uma alegria. Ele contava histórias, nós ouvíamos atentamente, riamos algumas vezes. Então, era isso: com meu pai tinha sempre esse tipo de
aventura.
Nova
Voz On Line
– Cássio, você realizou o sonho do seu pai, na área do estudo. Com muita
dedicação cursou sociologia, fez o Mestrado, foi fazer o Doutorado, é professor
universitário. Como seu pai interagia com todo esse seu trabalho?
Cássio - Acho que meu
pai foi determinante para a escolha profissional que fiz, e por vários motivos.
Primeiro porque ele me tirou de casa aos sete anos de idade, para acompanhá-lo
aos sábados na fazenda, em São José de Ubá. Naquela época, final dos anos 70, a
fazenda ainda era um lugar cheio de gente, as pessoas moravam na terra:
funcionários, suas famílias, crianças. Essa experiência foi definitiva para mim
pelo contato com as pessoas, pelo convívio humano.
Nova Voz On Line – Essa coisa de ser muito
gente, era bem típico do seu pai, não é mesmo?
Cássio - Meu pai
administrava a terra de um modo muito particular, como se fosse o prefeito da
fazenda. Me recordo da alegria dele quando conseguiu, por intermédio de Agnaldo
Peres Melo, então prefeito de Cambuci, levar uma escola municipal para a
fazenda. Ele se encantava vendo aquelas crianças chegando de manhã, de todos os
cantos da redondeza, com cadernos e lápis na mão. Depois, tinha o trabalho na
fazenda, os animais, os almoços na casa do administrador, a comida, a mesa
pronta, todo mundo junto, o fogão a lenha. A noite era iluminada pela luz de
lamparina.
Nova Voz On Line – Isso terminou te influenciando?
Cássio - Acho que
esse contato com as pessoas, com o cotidiano da vida simples do campo, me abriu
os olhos para todos os aspectos da vivência humana. Era um mundo rico de experiências.
Sem aqueles sábados na fazenda, com meu pai, certamente teria me faltado uma
parte considerável daquilo que eu sou hoje. Esse é o primeiro aspecto.
Sanção do Prefeito Manoel Faria, ao projeto da CMI, que criou a Rua Vice Prefeito José Maria Fernandes |
Nova Voz On Line – O que mais?
Cássio - Além disso,
meu pai era muito interessado por história, geografia e política. As conversas
na minha casa descambavam sempre para assuntos dessa natureza. Isso me fez
entender logo cedo que política, tanto na esfera da ação quanto do pensamento,
é o campo mais elevado da vida humana. E tínhamos ainda correntemente uma
conversa sobre geografia. Meu pai conhecia bem geografia, gostava da matéria.
Ele sabia, por exemplo, coisa que pouca gente sabe: a posição dos rios no
continente europeu.
Nova Voz On Line – Que interessante!
Cássio - Essa troca
foi formando em mim uma espécie de mapa mental. Acho que ainda hoje, no
trabalho que desenvolvo, meu raciocínio é estruturalmente geográfico, e muito
em função dessas nossas conversas. Isso tem a ver também com a mencionada vivência
na fazenda, porque a experiência que tive durante anos, montado a cavalo, na
velocidade do passo do animal, observando as várzeas, os morros, os córregos,
construiu em mim uma noção topográfica. Quase como uma observação do mundo numa
viagem de balão: a terra, as plantas, os animais e os homens no meio do mundo.
Era uma visão de geografia humana que ia se formando em mim. E tudo isso se
combinava, depois, nas conversas com meu pai, porque para ele todas essas
questões eram importantes e se integravam: o pontilhão a ser construído na
fazenda, a administração da cidade e as questões políticas em âmbito nacional,
tudo era parte do mesmo mundo. E sabia conversar todos os assuntos. Gostava de
ouvir, o que é fundamental no curso da conversa.
Nova Voz On Line – Vocês conversavam sempre né?
Cássio - Mais tarde, quando
eu estava na faculdade, e voltava para Itaocara nos finais de semana, ele
queria saber o que eu estava estudando, o que estava lendo. Então, ele era
interessado na Sociologia e na Ciência Política, que eram parte da minha
formação da UFF. Quando fui viver em Campinas, nossa conversa por telefone, aos
domingos, durava uma hora e meia. Hoje tenho clareza de que, na verdade, era
ele quem sabia melhor as coisas. Tinha uma inteligência muito aguçada, sabia ir
ao ponto central dos assuntos.
Nova
Voz On Line
– Aliás, Cássio, quais memórias guarda dele, dos dias que passaram juntos na Europa,
quando você concluiu seu doutorado, na Universidade de Pisa? Pode nos contar
alguma história que guardou destes dias?
Cássio - Tenho três
lembranças recorrentes desse mês que passamos juntos na Itália e em Portugal.
Duas emoções que ele sentiu, de que me recordo sempre. Uma, diante do Palácio
Público de Pisa, se emocionou enquanto eu lia para ele sobre a República de
Pisa, construção política medieval, na qual se sustentava o governo da cidade.
A outra, no Museu dos Uffizi, em Florença, quando chegou às lágrimas vendo a
“Anunciação” pintada por Leonardo da Vinci. Ele se emocionou observando como
Leonardo conseguiu pintar a transparência das folhas da Bíblia que Nossa
Senhora tinha sobre a mesa quando o Anjo anuncia a vinda de Jesus. A terceira
lembrança é que ele, naquele mês de viagem, ligava todo dia para Itaocara,
porque não podia ficar sem as notícias da política local. Falava todo dia com
os amigos e assim ia administrando, à distância, as questões políticas de
Itaocara. Não se desligava da vida ativa que levava na cidade. Esse era o
centro da vida dele.
Nova
Voz On Line
- Por fim, deixamos ambos à vontade para falar novamente da homenagem que a
família recebe, da Rua Vice Prefeito José Maria Fernandes, que surge pela
iniciativa o Vereador Jaderson Aleixo, aprovado pela Câmara de Itaocara e
sancionado pelo Prefeito Municipal.
Bethânia e Cássio - Queremos
novamente externar nossos agradecimentos ao poder público de Itaocara por essa
homenagem, que recebemos com muito orgulho, e que demonstra também um dado
muito importante: o cuidado que os
representantes do município têm com a memória da cidade. O reconhecimento, por parte dos representantes do poder
público, do trabalho daqueles que no passado se dedicaram pelo desenvolvimento
do município é um sinal do esforço da atual gestão pela realização do bom
governo. E sendo esta uma homenagem da Câmara dos Vereadores, portanto, da casa
do povo de Itaocara, a recebemos como um abraço que José Maria Fernandes recebe
de toda a população do município que ele tanto amou. Especialmente muito
obrigado ao Vereador Jaderson Aleixo, que foi autor da iniciativa. Nunca iremos
esquecê-lo! Muito obrigado novamente!
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