Henrique Resende provavelmente é o itaocarense número um, que está entre nós. Sua arte impressiona pelo talento. E SEU amor por ITAOCARA é marcante. Leia abaixo o bate papo que publicamos em 2013.
Henrique Resende ao lado de Dercy Gonçalves e Fernanda Montenegro |
Nova
Voz ONLINE
- Desde quando foi possível perceber que você tinha talento artístico?
Henrique
Resende
- Quando eu tinha por volta dos 5 anos de idade ficava maravilhado quando minha
mãe desembrulhava os pães pela manhã. Aquele papel tosco e grande. Não queria
os pães e sim desenhar no suporte meio amassado. Naquela época, mesmo antes de
aprender a ler e escrever, criava estórias em quadrinhos, e ditava para minha
mãe escrever. Estas foram as minhas primeiras experiências.
Nova
Voz ONLINE
- A partir daí, ou seja, da consciência de que tinha habilidades especiais para
as artes plásticas, o que fez visando trabalhar este talento?
Henrique
Resende
- As coisas foram acontecendo naturalmente. Nada foi repentino. A arte, para
mim, sempre foi uma necessidade interna. Desde criança a minha paixão era o
desenho. Por volta dos 12 anos, comecei a ler sobre os grandes gênios da
pintura. Fui crescendo e a paixão cresceu junto. Meus pais sempre apoiaram
muito, criando um ambiente permissivo para minhas viagens criativas. Meus pais
sempre tiveram muito orgulho das minhas habilidades com o desenho.
Henrique em seu Ateliê trabalhando um busto Dom Pedro II |
Nova
Voz ONLINE
- Dizem que os artistas mudam de fase, assim como os passarinhos, mudam de
penas. Houve um momento em que você tinha enorme admiração por Salvador Dali. O
que o levou a mudar de opinião sobre ele?
Henrique
Resende
- Gostar de Salvador Dalí é natural para todo artista iniciante. Acontece que,
embora com um talento indiscutível, o Dalí deixou de “pintar arte” para “pintar
espetáculos”.
Nova
Voz ONLINE
– Como assim?
Henrique
Resende
- Quando surgiu o surrealismo e o Dalí passou a fazer parte do movimento, ele
era muito melhor. Pintava pequenas telas. Era como se essas telas falassem de
coisas íntimas. Guardadas no subconsciente. Suas imagens estavam em consonância
com a proposta. Mas depois, deixou de ser verdadeiro consigo mesmo, para
produzir algo que chamasse mais a atenção de um público pouco preparado.
Nova Voz ONLINE – O surrealismo
encontrou nele seu ápice?
Henrique
Resende
– Não. Existem pintores surrealistas muito melhores que o Dalí, como por
exemplo o Magritte. Mas para apreciar uma boa pintura, o público não precisa
estudar ou ter grandes conhecimentos de arte. Basta acostumar os olhos e a alma
às várias manifestações e estilos, olhando não só o Dali, mas também grandes
gênios como Odilon Redon e Gustav Klint. Com os olhos acostumados, podemos
perceber claramente uma arte de boa ou de má qualidade.
Henrique Resende e Itaocara
Nova
Voz ONLINE
- Qual é a conexão entre sua arte e o município de Itaocara? Em que nossa
cidade lhe influencia?
Henrique
Resende
- Meus trabalhos carregam uma espécie de “sotaque” do interior. Não tanto pela
temática. Meus quadros e esculturas deixam perceber uma espécie de poética
caipira. Na verdade é algo que realmente busco.
O Monumento ao Frei Tomás |
Nova
Voz ONLINE
– Pode explicar melhor?
Henrique
Resende
- Quero refletir alguma coisa realmente verdadeira. E a verdade na arte não é
apenas uma verdade que reside no interior do artista, mas o que está no ar e ao
redor dele. Não que queira realizar um trabalho regionalista. Mas é no meio
mais familiar que descobrimos coisas realmente singulares e ao mesmo tempo
universais e que toquem em coisas mais amplas como a condição humana.
Nova
Voz ONLINE
- Você é também um artista engajado no movimento cultural da cidade. É membro fundador
da Associação Itaocarense de Artistas, desde o início participa do Teatro Rock
Hudson, tem escola de pintura. Qual é a relevância dessa atividade?
Henrique
Resende
- É importante trabalharmos para que a vida seja levada, não apenas
prosaicamente, mas poeticamente e de maneira mais leve. Coisas simples devem
ser apreciadas, e quanto mais se conhece, mais se aprecia. Tudo o que diz
respeito às raízes, às manifestações espontâneas, às realizações do pensamento
e do espírito humano me interessam e de alguma forma fazem parte da minha vida.
Nova
Voz ONLINE
- Entre suas obras, haveria alguma que se destaca individualmente? Citando um
exemplo, pintar o teto da Igreja de São José de Leonissa, foi um marco em sua
carreira?
Henrique
Resende
- Há trabalhos que realizei que gosto mais. Outros menos. E ainda há os que não
gosto. Quanto ao teto da Igreja Matriz de Itaocara, foi uma experiência
fascinante pintá-lo. Foram dois meses e meio naquele trabalho. Pude conhecer
melhor a vida de São José de Leonissa, o padroeiro de Itaocara, que é a única
cidade do Brasil que tem como padroeiro este Santo italiano.
Nova
Voz ONLINE
– Que interessante.
Henrique
Resende
- Para criar a pintura, busquei levar em conta a arquitetura da Igreja, para
não virar apenas um adorno de superfície. A cena principal mostra o momento em
que um anjo enviado por Deus, salva São José de Leonissa da morte. Ele havia
sido condenado a “pena do gancho” pelo Sultão que não queria ouvir as pregações
do Santo. A pena consistia em pendurar o condenado num poste por dois ganchos,
um cravado em uma das mãos e o outro num dos pés e, embaixo, uma fogueira.
Escolhi retratar esta passagem pelo grande impacto visual que ela poderia
ocasionar.
Nova
Voz ONLINE
- Tenho certeza de que se há algo que satisfaz o artista, é expor publicamente
sua obra. Nessa perspectiva, que importância dá ao trevo de Itaocara, ao busto
de Patápio Silva e a estátua do Frei Thomas, monumentos perenes na vida de
nossa cidade?
Henrique
Resende
- Para que exista a arte, são necessárias três coisas: O artista, a obra e o
público. Nos espaços convencionais, dedicados à arte, o público acaba sendo
restrito. Muitas vezes elitizado. Por isso, acho muito importante obras de arte
em espaços abertos e públicos. É uma honra muito grande ter alguns trabalhos
meus espalhados pela cidade em que nasci.
Dercy Gonçalves
Nova
Voz ONLINE
- A Dercy Gonçalves é alguém importante em sua carreira. Fale um pouco dela e
do monumento que esculpiu da famosa artista brasileira?
Henrique
Resende
- Dercy foi um presente maravilhoso pra mim. E veio num momento fascinante e
meio como “atração”. Explico: sempre gostei muito de desenhar idosos. No
colégio era assim. Quem estudou comigo sabe disso. O tempo passou e continuei
produzindo e retratando idosos.
Dercy imortalizada por Henrique Resende |
Nova
Voz ONLINE
– Essa não sabia.
Henrique
Resende
- Em 2002 iniciei uma série de pinturas em que retratava velhinhos de um asilo.
No ano seguinte, ainda produzindo trabalhos dessa série, surge a Dercy e a
encomenda do monumento. Pude então conviver um pouco com a velhinha mais
fantástica que poderia surgir.
Nova
Voz ONLINE
– Grande personalidade, não é mesmo?
Henrique
Resende
- Dercy foi uma força da natureza. Um furacão de paixão pela vida. Um exemplo
de dignidade e transparência. E foi a transparência que busquei retratar e
expressar no monumento. Uma escultura de quatro metros de altura e
aproximadamente dez toneladas, que se encontra na cidade natal da atriz.
Nova
Voz ONLINE
– Isso impactou seu processo de criação?
Henrique
Resende
- Com a realização desse monumento, algumas questões começaram a me interessar
mais, como por exemplo, a leveza da forma escultórica e a relação da forma com
o seu entorno. Então resolvi me aprofundar mais em escultura e, com os recursos
que recebi pelo monumento, fui para a Itália (cidade de Carrara) estudar na
Arco Arte com o artista Boutros Romhein.
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