Dona Dirce é uma das mais conhecidas
itaocarenses. Famosa pela comida sempre deliciosa, que serve aos clientes e
amigos do Hotel Zezé, é também lembrada pelos ex-alunos, como professora
enérgica, mas que tinha sempre uma palavra amiga a oferecer. Com sua vida,
ajudou a construir os 129 anos do Município.
Um dia especial, com Dona Dirce ao lado da Família |
Nova Voz On Line – Quais são as principais lembranças da infância?
Dona Dirce – São muitas. A começar pelo
meu pai, Moacir Henriques Duarte, um homem maravilhoso. Enérgico e
compreensivo, ao mesmo tempo. Adorava participar de festas. Já de minha mãe,
Maria Teresa Duarte, lembro-me das comidas deliciosas que preparava para nós,
seus filhos. Até hoje nossa cozinheira, que está conosco faz 38 anos, e é da
família, guarda receitas que aprendeu com minha mãe. Eu, Elza, Iná, Monclar,
Edilá e Enir, éramos muito unidos.
Nova Voz On Line – E dos momentos difíceis,
quais são as lembranças?
Dona Dirce – Da poliomielite que meu pai
foi acometido, quando eu ainda era criança. Ele ficou sem os movimentos das
pernas, o que nos levou a ter que trabalhar logo cedo, para que pudéssemos
manter as despesas da casa. Começamos então a vender marmitas. Eu e minha irmã,
Édila, entregávamos as marmitas aos clientes. O Monclar aprendeu o ofício de
alfaiate com o Sr. José Caldeira. Minha irmã Elza era muito estudiosa e seguiu
o caminho da educação. Em 1942, se formou professora. Assim fomos superando as
dificuldades.
Nova Voz On Line – Essas dificuldades fizeram os
irmãos mais unidos?
Dona Dirce – Com certeza. Até hoje
persiste essa união. Meus sobrinhos são como filhos para mim. Os irmãos, bem
mais que irmãos.
Nova Voz On Line – Numa época em que não se
valorizava tanto a educação, principalmente das mulheres, seu pai era
diferente. Incentivava a senhora e suas irmãs a estudar, não é mesmo?
Dona Dirce – Meu pai fazia questão que os
filhos estudassem e fossem educados. Comecei no Grupo Escolar Saldanha da Gama
(onde fica o antigo fórum – atual Prefeitura), fazendo lá até 5° série. Depois
tive que parar, pois não possuía condição de frequentar as escolas de Pádua,
Miracema ou ir para o Rio. Porém, em 1947, foi criado o Colégio Itaocara.
Nova Voz On Line – E suas irmãs?
Dona Dirce - Édila e Eni estudavam em Cantagalo
e vieram transferidas para cá. O Dr. Whagabhi trouxe os cunhados, Roberto,
Antonio José (o magro do MPB 4), Carlinhos e mais outros colegas para Itaocara.
De Laranjais vieram muitos alunos. Lembro-me do Nico Alves (avó do Dr. Paulo
Roberto da CEDAE). Quem também estudava fora e retornou foram a Dioneia, a
Gladys Caldeira, a Emília Maia e a Marli. O Colégio Itaocara começou com todas
as séries, graças ao Sr. Juca Rocha, cuja visão trouxe os itaocarenses de volta
para casa.
A Itaocara de Outros Tempos
Nova Voz On Line – Como era a vida social nesta
época?
Dona Dirce – Dos tempos de criança,
lembro-me dos bailes da primavera, que os jovens curtiam dentro de uma pureza
maravilhosa. Ainda não tinha idade para frequentar, mas ficava ouvindo as
histórias e sonhando com minha vez de ser adolescente. Tínhamos o Clube Malba
Tahan e a estação de rádio da praça, onde dávamos a volta ouvindo música. Coisa
que hoje só se vê nos bons filmes do cinema. As conversas entre os jovens e
mesmo com os pais eram muito importantes. Ouvíamos histórias que sempre nos
ensinavam algo.
Hoje Dona Dirce completa 92 anos. Efusivos PARABÉNS a aniversariante |
Nova Voz On Line – Como conheceu o Sr.
Florentino, com quem veio a se casar?
Dona Dirce – Ele era um homem ótimo. Minha
família gostava dele desde os tempos em que eu era menina e ele um jovem. Antes
de mim, Florentino já havia sido casado, mas ficou viúvo. Depois que passou o
tempo do luto, ele realmente começou a me procurar. Era até engraçado, pois
aonde ia, encontrava com ele. Aposto que não por coincidência. Mas tudo com
muito respeito, como era o costume da época. No início não quis namorar.
Entretanto, no dia 18 de Maio de 1958, não resisti a tanto charme e nos
casamos. Ficamos juntos até o ano de 2003, quando ele faleceu. Se fui o amor da
vida dele, com certeza, ele é o grande amor da minha vida.
Nova Voz On Line – Qual é o segredo de manter um
casamento tão longevo assim?
Dona Dirce – Compreensão. Brigar sobre
quem está certo e quem está errado, não ajuda em nada. É preciso ter um
sentimento maior de que a relação não permite egoísmo. No casamento, duas
pessoas passam a ser uma só. Assim é possível manter um casamento de 45 anos.
Nova Voz On Line – O companheirismo também é
importante?
Dona Dirce – Sim. O Florentino sempre
esteve ao meu lado na realização dos meus sonhos. Em 1972, fui fazer faculdade em
Nova Friburgo, contando com seu apoio.
Quando meu pai mudou-se e nos deixou o Hotel, ele foi meu parceiro. E olha que
era funcionário do Ministério do Trabalho, mas mesmo assim trabalhava junto
comigo. Um marido realmente maravilhoso. Amigo e compreensivo.
Nova Voz On Line – Seus sobrinhos são bem chegados
à senhora, não é mesmo?
Dona Dirce – São filhos. Lembro-me que o
Monclar, meu irmão, era Oficial de Justiça em Cordeiro. Quando a Moncléia
nasceu, vieram para Itaocara. Desde essa época estão aqui conosco. Todos sempre
me respeitaram e até hoje respeitam. Tenho muito orgulho deles e dos meus
filhos. Pessoas de bem, que criaram suas famílias com honra e dignidade.
Nova Voz On Line – E os filhos, Tadeu e Thereza?
Dona Dirce – O Tadeu nasceu com seis meses
e lutou muito, já naqueles primeiro dias, para sobreviver. Não existia essa
tecnologia toda de hoje, com incubadoras modernas. Tivemos que mantê-lo no
algodão, até que saísse do risco. É um filho que amo e sinto orgulho, pela
coragem que tem de superar os problemas, com altivez e cabeça erguida. Já
Thereza seguiu meus passos e tornou-se professora. É formada ainda em
Ciências Sócias , pela faculdade Santa
Dorothéa, em
Nova Friburgo. Querida pelos alunos e
admirada pelos colegas professores. Sua marca principal é a alegria e o modo de
receber os outros com coração aberto.
Admiração pelos Professores e Grandes Itaocarenses
Nova Voz On Line – Quem são as personalidades
que senhora mais aprecia e acha que colaboram com a história de Itaocara?
Dona Dirce – Minha admiração vai para
todos os professores! Nós, professores, temos uma missão especial.
Infelizmente, desvalorizada, pelos governos e pela própria sociedade. Gente
como a professora Jaysa Pinheiro, que tantas e tantas gerações de itaocarense
ajudou a formar. A Elza Duarte (minha irmã), professora de música e arte. Dona
Inaiá Monteiro de Paiva, que foi diretora; Dona Eni Seixas Pires. Estas dos
meus tempos iniciais na educação. Depois veio o Professor Nildo Nara, que
sucedeu Silvio Freire na Direção do Colégio Itaocara.
Nova Voz On Line – A senhora menciona muito o
Dr. Sabino, não é mesmo?
Dona Dirce - Dr. José Sabino Catete Silva,
um dos maiores itaocarenses da nossa história. Injustamente pouco lembrado. Foi
quem construiu o primeiro prédio do antigo João Brazil (atual Colégio Nildo
Nara). Lembro-me que era muito exigente, gostava de tudo certo e ao mesmo tempo
uma pessoa grandiosa, daqueles que tem o coração que não cabe no peito de tanto
querer fazer o bem.
Nova Voz – Mais alguns Itaocarenses?
Dona Dirce – MUITOS! Meu amigo William
Rimes. Grande professor, escritor e poeta. O Monsenhor Saraiva, que foi
professor de Frances e marca Itaocara pela preocupação com o próximo. José
Jorge (Bechara), que tenho o prazer de dizer que foi meu aluno. Alias, o Dr.
Alcione Araújo, Prefeito de Itaocara, foi meu aluno. Os ex-prefeitos Dr.
Robério e o José Romar. O Faria Souto, a maior e melhor referencia de muitas
gerações, pelo brilhantismo e genialidade. O senhor Carlinhos Soares, que foi
responsável pela disciplina no João Brasil e amava aquela escola. A Noêmia e o
Tãozinho: não consigo imaginar pessoas melhores. Além de mestres em português e
matemática. Noêmia e Tãozinho sempre se preocuparam com o futuro dos alunos,
muito além das notas das provas. Há diversos outros. Gente humilde e grandiosa
ao mesmo tempo. Itaocara é terra de gigantes.
Nova Voz On Line – Nestes anos de vida da
senhora, a família mudou muito. No Dia das Mães que se aproxima o que teria a
dizer aos leitores?
Dona Dirce – Todas as famílias têm direito
de educar os filhos da forma que pensam ser melhor. Mas o amor não pode faltar.
Esse amor precisa se manifestar de várias formas. Beijos, abraços, carinhos,
com certeza. Mas às vezes demonstramos amor com uma repreensão a um filho ou a
um sobrinho, quando fazem algo que não devem. Dizer não ou dar uma palmada
machuca a quem precisa educar; mas nem o pai, nem a mãe, podem abrir mão de
mostrar quais são os limites a serem obedecidos. Especialmente quando os filhos
são crianças e adolescentes. Ao se tornarem adultos, eles vão reconhecer e
contar como foi bom ter sofrido aquela reprimenda.
Nova Voz On Line – Domingo vai ganhar presente
de filhos, sobrinhos, netos e etc? (Entrevista publicada na época de um
Domingo, dia das Mães).
Dona Dirce – Espero que sim (risos). Ter
uma família grande tem estas compensações. Recebo muitos abraços e beijos, nas
épocas especiais do ano. Nesse Dia das Mães não vai ser diferente. Tenho
certeza que estarei recebendo os parabéns de todos e vou retribuir com
agradecimento, pois minha família é o grande motivo da felicidade que sinto.
Para outras mães, desejo o mesmo e peço a Deus que permita mais do que
presentes materiais, que são efêmeros na realidade. Mas os presentes do
coração, como as manifestações de amor entre filhos e mães. Feliz Dia das Mães.
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