-->

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Lucília Maria Rosa de Ornellas: Mãe, Avó e Bisavó, a história de uma Matriarca Itaocarense


Quem a vê sentada na frente de sua casa, na Rua Coronel Pita de Castro, não consegue imaginar a riquíssima trajetória de vida, da senhora Lucília Maria Rosa de Ornellas, que atualmente está com 96 anos. Ela é viúva de um dos maiores itaocarenses de todos os tempos, o empresário e político, Marino Coelho Ornellas. Temos o prazer de contar um pouco da história dessa grande mãe, cujos filhos Neuzy. Nelma, Nélio, Neyde e Nilson, os netos e os bisnetos, são fonte de grande orgulho.

A Saudosa Matriarca da Família Ornellas, Dona Lucíola, comemorando o aniversário com os filhos, Nelma, Neide, Nilson, Nélio e Neuzy (estes dois últimos, já falecidos)

Nova Voz On Line - Quais suas principais lembranças da infância?
Lucília - Nasci em Itaocara, cidade do interior. Minha infância foi normal, como qualquer criança. Brincadeiras de rodas, pique esconde, pique alto, passar anel, reuniões familiares, teatro infantil, eram freqüentes. Nós íamos à casa das colegas para brincar de bonecas, fazer roupas, batizados delas e cozinhados. Hoje, não se vê mais crianças brincando de rodas. As crianças não têm infância. Estudei com a professora Lívia, da alfabetização à terceira série, em aulas particulares. Depois fui estudar no Colégio Saldanha da Gama (Frei Tomás, local hoje da Prefeitura nova), cursando a quarta e quinta séries, com Dona Lucrécia Villas.

Nova Voz On Line – A senhora gostava de estudar?
Lucília - Na quinta série, fui a melhor aluna da classe, tirando 10 com louvor em todas as disciplinas durante o ano todo. A diretora, Dona Romana, diante deste fato, me deu uma bolsa de estudos para fazer o curso normal (a quinta série equivalia, hoje, ao ensino médio completo), no Rio de janeiro. Ela foi pessoalmente à minha casa para dar a notícia, mas minha mãe não permitiu. Fui, então, trabalhar com D. Sinhá Costa, costureira de fama. Costurava vestidos e roupas para as madames do Rio de Janeiro. À noite, costurava para mim e meus irmãos, bordava, fazia casinha de abelhas nas roupas de crianças, e ponto smock, ponto paris nas camisolas das noivas, ponto matiz nas toalhas e lençóis, bainha de laçada e crochê.

Nova Voz On Line – A senhora ficou chateada por não ir estudar no Rio e ter que ficar trabalhando aqui?
Lucília – Claro que não. Minha geração gosta muito de trabalhar. Dando seguimento a minha vida, fui trabalhar na Venda de Tecidos e Retalhos do Sr. Braz de Cusatis, na Praça Coronel Guimarães, onde hoje é a escola de Inglês Wizard. Nas horas vagas, à tardinha, íamos para casa da Dona Cininha Simões, ajudando a fazer flores de papel crepom, para coroa de flores, e aprender fazer bonecas de pano.

Nova Voz On Line - Como era viver em Itaocara em sua adolescência?
Lucília – Era ótimo. Às quartas-feiras e aos domingos, nós, jovens, freqüentávamos a Praça Cel. Guimarães, ouvindo a rádio YC2, no prédio de Dona pepita Machado, onde também funcionava a biblioteca e o Itacine (atualmente o prédio ao lado do Clube União). Os bailes e os carnavais de Itaocara eram realizados no Itacine. Diversão bem inocente. O objetivo era rir e nos sentirmos felizes. Foi uma época fantástica, sem dúvida alguma.

Nova Voz On Line - Como a senhora conheceu o Sr. Marino  Ornellas?
Lucília - Cidade pequena, todos são conhecidos. Marino morava no Caeté (na zona rural), e vinha à cavalo para Itaocara. Eu sabia que ele tinha namorada firme, quase noivo. Mas nós flertávamos. Ele sempre mandava recados, querendo conversar comigo. Num dos bailes no Itacine, ele chegou perto de mim, começamos a conversar e ele me tirou para dançar.

Neyde Ornellas com o pai, Marino Ornellas, um dos mais importantes empreendedores da história do município de Itaocara

Nova Voz On Line – Essa história daria um filme de amor.
Lucília - Ele terminou o namoro firme, e pediu permissão a minha mãe para namorarmos. Eu tinha 18 e ele 19 anos. Namoramos durante três anos. Casamos em 31/07/1940. O meu enxoval de noiva foi feito todo por mim. Eu era muito habilidosa.

Nova Voz On Line - É verdade que havia muita vigilância da família no namoro daquela época?
Lucília - O namoro de antigamente era muito reservado e controlado pelos pais. Havia muito respeito pelas famílias, principalmente em cidades do interior, onde todos se conhecem.

Nova Voz On Line - A função da mulher, então era ser dona de casa e criar os filhos? Pode nos falar um pouco sobre esse momento?
Lucília - Quando nos casamos, fomos morar no Caeté, com meus sogros. Ficamos lá durante sete meses. Grávida da minha primeira filha, Neuzy, nos mudamos para Itaocara, para a Rua Coronel Pitta de Castro (onde hoje é casa do Sr. Olisses França). Na época o Marino trabalhava como açougueiro. Fomos morar então, na Rua Nilo Peçanha. Compramos a Venda Secos e Molhados do Sr. Armindo - meu sogro. Ali, nossa segunda filha, Nelma, nasceu. Marino passou a venda para seu irmão, Manoel Ornellas, e fez Sociedade com o Sr. Resende, numa empresa de Armazém e Máquinas de Arroz, na Ponta da Areia (no local hoje estão o Bazar Cremonez, A Farmácia Droga Lima, Loja A Garotinha e Studio Semiana). Mudamos novamente. Dessa vez para a Rua Cel. Pitta de Castro, 83 (a parte dos fundos do Clube União). Fiquei então grávida do 3º filho, Nélio.

Nova Voz On Line – Nessa época que sua mãe faleceu?
Lucília – Infelizmente sim. Eu e o Marino assumimos os meus sete irmãos: 2 gêmeas de 4 anos e os outros, de 6 anos, 9 anos, 11 anos, 13 anos e 15 anos. Também meu pai de criação. Ao todo, 12 pessoas foram morar em minha casa.

Dona Nelma Ornellas, com suas saudosas mãe, Lucíola e irmã, Neuzy

Nova Voz On Line – O Sr. Marino continuava cuidando dos negócios?
Lucília – Ele desfez a sociedade com o Sr. Resende. Comprou dois caminhões KB6 internacional. Fazia compra e venda de cereais no Rio de Janeiro e vendia no município de Itaocara. Ele viajava muito. Às vezes ficava na estrada 15 dias. Até um mês. Ir ao Rio não era fácil como hoje. Eu ficava tomando conta da casa, que era a função da mulher de antigamente: criar, educar e orientar os filhos. Além de cozinhar, eu costurava para toda família. Não se comprava roupas prontas em lojas. Eram feitas em casa. Lavava, passava, e arrumava tempo para bordar por encomenda, ajudando nas despesas da casa.

Nova Voz On Line – Apesar das dificuldades, foram tempos felizes?
Lucília – Certamente. Meus filhos e meus irmãos, todos foram batizados e fizeram primeira comunhão na Igreja Católica. Nasceram nessa casa mais dois filhos, Nelza e Neyde. Mudamos para a Cel. Pitta de Castro, 228 (onde hoje mora a Neyde). Lá nasceu o Nilson, o filho caçula. Encaminhamos nossos filhos e meus irmãos, estudando no Colégio Itaocara (particular).

Nova Voz On Line – A senhora era típica mãezona de época para todos?
Lucília - Eu dizia: “se não passarem de série, vão ter que repetir”. Eu ameaçava: ‘vocês vão ficar de bengala na mão, mas têm que estudar’. Lembro-me como se fosse hoje. Ajudava meus filhos nas traduções de Inglês, Francês e Latim, quando tinham dificuldades. Nunca tiveram aulas particulares. A função era minha. Muitos anos depois, fomos morar na Fazenda Santa Clara, na zona rural, onde funcionava a fábrica de cachaça.

Nova Voz On Line – Era uma vida muito dura.
Lucília - Muito trabalho. Mas éramos muito felizes. O Marino se tornou um dos mais importantes empresários da história de Itaocara. Bom lembrar o que dizem: “por traz de um grande homem, existe uma grande mulher”. É a pura verdade (risos).

Nelma com a Mãe Luciolá e irmão Nilson Ornellas 

Nova Voz On Line - O Senhor Marino trabalhou bastante. Participou ativamente da vida política do município. Mas a senhora sempre preferiu ficar distante, não é mesmo?
Lucília – Tenho orgulho do meu marido. Marino sempre foi um homem de negócios. Participava, não só na política, como na vida social de Itaocara. Quando possível eu o acompanhava. Minha família tomava parte dos eventos, como carnaval e os bailes. Eu dava apoio total. Na vida política, nunca participei, porque era tímida. Também não tinha tempo, com uma família tão grande para criar e educar. E nunca gostei de política.

Nova Voz On Line – Atualmente os casamentos que duram 10 anos são recordistas. Mas a senhora foi casada com um único homem, durante toda a vida. É um grande desafio manter o casamento por tanto tempo?
Lucília – Penso que não é. Quando o homem e a mulher se casam por amor, tudo é superado. Sou muito agradecida pelo marido que escolhi. Ele foi um ótimo filho, um ótimo irmão, um ótimo cunhado, um ótimo marido e um pai maravilhoso. Sempre muito dedicado à família. Nós construímos uma família com carinho e com muito trabalho, tanto da minha parte quanto da parte dele. Casamento não é brincadeira. Deve ser encarado de forma séria. Assim sempre vai dar certo.

Nova Voz On Line - Depois dos filhos, vieram os netos e os bisnetos. E a senhora continua vivendo feliz, aproveitando os bons momentos, ao lado da família. Pode nos contar um pouco sobre isto?
Lucília – Sou feliz porque cumpri minha missão. Tenho uma família digna, com filhos, netos e bisnetos, com saúde. Todos são pessoas honestas, o que neste país é de grande orgulho. Graças a Deus! A única coisa que sinto, e vou sentir até o último suspiro é saudades do meu marido. Gostaria que o Marino estivesse aqui, desfrutando de tudo ao meu lado.

Nova Voz On Line - A senhora acha que as mulheres são mais felizes hoje, quando podem ter a própria profissão, namorar livremente, enfim, ter uma vida independente?
Lucília - Os tempos mudaram. A mulher de hoje escolhe a profissão que quer. Os namoros são diferentes. Há muita liberdade. Mesmo assim não diria que são mais felizes, nem que a minha geração foi mais feliz. Ser feliz é saber desfrutar o momento de modo pleno. Por isso é tolo comparar. O que posso dizer, com máxima certeza é que fui e sou muito feliz.

Nova Voz On Line - Qual é a receita para chegar a sua idade, lúcida e com saúde?
Lucília - Eu trabalhei muito, mas somente em casa, educando e encaminhando meus filhos. Nunca fumei. Não sinto nada. Não tomo remédios. Não tenho pressão alta. Não sou diabética. Não tenho problemas de coração. Durmo muito bem. Eu sempre li muito. Desde cedo, fui muito estudiosa. Se me perguntarem as capitais dos Estados do Brasil, dos países da América do Sul e de todo Mundo, sou capaz de dizer, na ponta da língua. Tenho 96 anos com muita saúde. Graças a Deus. Minha mente está ótima.

Nova Voz On Line - Do alto de sua experiência de vida, o que diria para as mulheres mais jovens, neste início de Século XXI?
Lucília - Aconselharia as jovens a estudarem e escolherem sua profissão. Só depois pensar em casamento. Hoje não estuda quem não quer. Há muita facilidade e liberdade para escolher o que quer ser na vida. Então aproveite o seu momento.

Share:

0 comentários:

Postar um comentário

Carlinhos Barrias - Bar dos Amigos

 


PARCEIRO


Studio Fênix - Visite


Itaocara Seguros

Core Contabilidade



Postagens mais visitadas

Arquivo do blog

Referências

Unordered List

Support