O estilo discreto dessa grande
itaocarense, com a qual continuamos a série em homenagem ao mês de Março, Mês da
Mulher, muitas vezes não nos deixa perceber quão guerreira ela sempre foi. Criada
numa época bem diferente da atual. Na Zona Rural. Maria Fátima Rosalino
Gomes, ao longo dos anos, foi vivendo de forma digna, construindo ao lado do
marido, o Farmacêutico Waltair Sias Gomes, uma família exemplar, sob os
princípios de solidariedade, religiosidade e respeito ao próximo. Magnífico
relato para os nossos leitores.
Fátima ao lado do marido Waltair e dos filhos Tiago e Vanessa |
Professora
Maria Fátima – De fato, ocorreram algumas transformações.
Quando criança, sobretudo, chamava-me a atenção o fato de os pais não
permitirem que meninas saíssem de casa para estudar. Havia a preocupação de que
elas ficassem “mal faladas”, ou corriam risco de “se perderem”, como diziam na
época. Como se a mulher não fosse dotada de inteligência, fosse incapaz de agir
dignamente por si mesma. Aliás, as meninas eram educadas para serem dependentes dos pais,
ou, bem cedo, de um marido. Felizmente não vivi tal situação, pois tive uma
grande mulher como mãe, a Dona Guiomar, que sempre atuou ao lado do meu pai
para que eu pudesse realizar o meu sonho.
Nova
Voz ONLINE
– Muito diferente dos dias atuais!
Professora
Maria Fátima - Outra realidade foi a mulher deixar de ser
apenas “do lar”, passando a trabalhar também fora de casa. A princípio,
exercendo funções que exigiam menor conhecimento, ou funções relacionadas a
seus dons maternais (ouvia-se muito: “isso não é para mulher”).
Nova
Voz ONLINE -
O que mais destacaria?
Professora
Maria Fátima - Uma novidade foi a inclusão de cotas na
legislação eleitoral, obrigando partidos políticos a inscreverem 20% de
mulheres em suas chapas proporcionais (Lei 9.100/95) com o objetivo de aumentar
a participação política da mulher na sociedade. Hoje vemos a mulher, tão
qualificada quanto o homem, inserida no mercado de trabalho, no cenário
político, tendo o direito de estar onde quiser, podendo manter-se dignamente. Embora, ainda, nem todas as
condições lhe sejam favoráveis.
Nova
Voz ONLINE
– O que mais lhe chamou atenção?
Professora
Maria Fátima - No DIA Internacional das Mulheres deste ano,
deparei-me com esta manchete: “As mulheres ganham espaço, mas comprometem a
saúde” (O Globo - pág 34 de domingo, 08-03-2020). A notícia dizia: “Segundo o
diretor médico da Med-Rio Check-Up, Gilberto Ururahy, há três décadas, quando a
clínica foi inaugurada, 40% das mulheres apresentavam sinais de estresse. Hoje
são 67%. Tal aumento é atribuído à tripla jornada. Segundo ele, as mulheres
trabalham, em média, até sete horas a mais do que os homens e ainda cuidam da
casa e estudam. O estilo de vida leva ao estresse que afeta o sistema
imunológico”. Constata-se então, que na maioria dos casos a conquista veio
acompanhada do aumento de funções, já que a divisão das tarefas domésticas não
é uma regra adotada em todas as famílias, mesmo que já tenha melhorado
consideravelmente.
O Aumento da Escolaridade das Mulheres
Nova
Voz ONLINE
- Tenho repetido essa pergunta, por achar relevante. Em sua opinião de
professora, quão importante foi, para todas as mudanças que vimos nas últimas
quatro ou cinco décadas, o aumento da escolaridade das mulheres?
Professora
Maria Fátima - Foi fundamental, pois conhecimento é poder. Sem
conhecimento não chegaríamos onde estamos. Minha mãe contava-me que sua avó
paterna, ao ver a evolução das netas dizia: “infeliz é o pai que deixa a filha
aprender a ler”.
Professora
Maria Fátima Rosalino Gomes - Paradoxalmente a isso, ela teve o privilégio de
contar com tias (por parte de mãe) que eram professoras, e que cuidavam para
que não lhe faltasse uma boa cultura. O aumento da escolaridade não só é o
caminho para a mulher conhecer os seus direitos, e ocupar maior espaço na
sociedade, como também lhe oportuniza concorrência menos desigual na busca por
uma profissão. As grandes transformações só foram e serão possíveis através da
educação.
Nova
Voz ONLINE
– Li que tão importante quanto as grandes lutas do movimento feminista durante
o século passado, foi a revolução silenciosa dos lares. Quando as mães, foram
dando aos seus filhos, fossem eles homens ou mulheres, uma educação para que se
respeitassem mutuamente, sem achar que um fosse superior ao outro, por questão
de gênero. Concorda com isso?
Professora
Maria Fátima - Não tenho dúvida: a semente para que tudo
acontecesse foi lançada nos lares. Mesmo após o auge do movimento feminista,
coube, ou cabe a nós, mães, educar nossos filhos ou filhas, para a conquista de
uma sociedade em que a convivência seja harmoniosa. Não apenas entre os
diferentes gêneros, mas entre raças, povos e nações. Leis só cumprem o seu
objetivo se houver mudança nos valores, o que se obtém quando a família
participa ativamente na educação dos meninos e das meninas, de modo a promover
o respeito mútuo e a igualdade de direitos e deveres.
Como o Pai Osvaldo Rosalino e a Mãe Guiomar |
Professora
Maria Fátima – O exemplo são as Leis que só têm eficácia,
havendo mudança na cultura da sociedade. Cito a que inclui cotas para mulheres
na legislação eleitoral. Mesmo após duas décadas, o espaço político ocupado
pelas mulheres continua muito pequeno, quando comparado aos homens.
Nova
Voz ONLINE
– E claro, não poderia ser outra a pergunta agora: na educação dos seus filhos,
Tiago e Vanessa, buscou ensinar-lhes a se respeitarem e a respeitarem aos
outros, de forma igual, independente se com quem se relacionassem, fossem
homens ou mulheres?
Professora
Maria Fátima Rosalino Gomes – Na educação dos meus filhos preocupei-me em
cultivar valores como honestidade, ética, amor e respeito ao próximo (sem
importar o credo, o gênero, a cor da pele ou a condição social desse próximo).
Como acredito que a melhor forma de educar é através do exemplo, procurei viver
de modo a ser um bom exemplo para eles.
A Importância da formação religiosa
no exercício da Liberdade
Nova
Voz ONLINE
– Ser livre, poder fazer o que quiser, não equivale a fazer qualquer coisa.
Concorda com essa assertiva? Ou seja, as mulheres (e os homens) precisam
desenvolver o senso de entendimento de que é necessário ter sabedoria no
desfrute da liberdade, pois se não a existência dos indivíduos torna-os
egoístas, sem se preocupar ou respeitar o próximo, inclusive seus familiares.
Concorda?
Professora
Maria Fátima – Infelizmente muitos entendem que liberdade é
fazer o que quiser. Este é um pensamento egoísta, que não condiz com a vida em
sociedade, pois tal condição impõe limites. Sabemos que em algumas situações,
enquanto se faz o que bem quer, pode-se estar impondo consequências terríveis
ao próximo.
Nova
Voz ONLINE
– Como exercer com sabedoria a liberdade?
Professora
Maria Fátima – É imprescindível estarmos atentos,
especialmente em família, onde a intimidade pressupõe maior liberdade. Tenhamos
sempre em mente que a nossa liberdade tem que ser vivida com responsabilidade.
Pensando no relacionamento entre homem e mulher, certamente, quando houver mais
respeito aos limites do próximo, os índices de violência doméstica e
feminicídio serão bem menores. Essa abordagem é bastante adequada,
especialmente nestes dias, em que o mundo convive com a Covid-19. É hora de
agirmos com responsabilidade, de sermos solidários (sempre nos colocando no
lugar do nosso irmão) e seguirmos as orientações das autoridades competentes,
com o objetivo de amenizar este mal que avança por todo o mundo.
Nova
Voz ONLINE
– Neste ponto, da busca do equilíbrio, para ter qualidade de vida, qual é o
papel da religião? Ela ajuda a entender que ‘existem mais coisas entre o céu e
a Terra, do que sonha nossa vã filosofia’, como diz Shakespeare na peça Hamlet?
Professora
Maria Fátima – A religião é fundamental em nossa jornada. É
pela religião que vivenciamos a fé, que nos fortalece nas dores e nos momentos
de dificuldades; tornando-nos capazes de lutar, sem muito nos abater, na
esperança da vitória. O amor ao próximo, a paciência, a tolerância, são valores
que a religiosidade faz crescer dentro de nós, e são estes valores que nos
ajudam, a não apenas suportar, mas também a sermos compreensivos perante as
diferenças alheias, possibilitando uma melhor convivência em sociedade na busca
da paz e da justiça.
Nova
Voz ONLINE
– A senhora tem uma importante formação religiosa, não é mesmo?
Professora
Maria Fátima – Sim. É na vivência cristã, que encontramos a
coragem, a força, e a moderação tão necessárias no enfrentamento desta pandemia
que a todos assusta e preocupa. A fé em Deus ajuda-nos a agir com prudência,
conforta-nos no isolamento social necessário neste momento e livra-nos do
desespero. Sejamos perseverantes na oração! Li esta frase e guardei em minha
memória: “Os valores cristãos são um farol seguro, pois trazem a marca do
próprio Jesus Cristo”.
Ao lado do marido e companheiro da vida, Waltair Sias Gomes |
Professora
Maria Fátima – Certamente! Você disse “esposa do Waltair”. Meu
marido é uma grande bênção em minha vida. Ser humano precioso. Alguém que
admiro e com quem tenho o prazer de conviver diariamente, há 43 anos. Meus
filhos são a concretização de um grande amor, sob as bênçãos da Sagrada
Família. Ser professora devo ao empenho da minha mãe e do meu pai, pois
morávamos em um sítio, numa época em que pequenas distâncias, tornavam-se
grandes, devido à ausência de meios de transporte.
Nova
Voz ONLINE
– Estudar era um desafio, não é mesmo?
Professora
Maria Fátima – Nos primeiros quatro anos pude estudar numa
pequena escola próxima a nossa casa, onde havia carência de professor,
exatamente pelo difícil acesso. Para amenizar o problema meus pais abrigavam
professoras em nossa casa.
E foi assim que fui preparada (em casa),
por uma grande professora, para prestar o Exame de Admissão ao Ginásio. Obtive
ótimo resultado, e segui estudando, até concretizar o meu sonho de menina.
Olhando para trás vejo que valeu a pena, pois acredito que durante o tempo em
que estive no exercício do Magistério (o que fiz com amor e muita dedicação)
despertei alguns sonhos e contribuí para a realização de tantos outros já
existentes.
Nova
Voz ONLINE
- O que gostaria de deixar de mensagem, para as mulheres que lerem nosso bate
papo?
Professora
Maria Fátima – Parabéns por tudo de melhor que representam!
Que Deus nos abençoe e nos dê a sabedoria para que enfrentemos as dificuldades,
guardando a graça, a sensibilidade, a alegria, a coragem, a determinação, e,
especialmente, para que sempre guardemos a dignidade de ser MULHER!
Parabéns Fátima! Vc verdadeiramente é um exemplo de mulher! 🌹 Feliz dia! 🌹 🌷
ResponderExcluir