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sábado, 28 de março de 2020

Moradora de Berlim, Ana Luíza Policani Freitas, fala sobre a história de lutas das Mulheres na Alemanha

No dia 8 de Março, comemorou-se o Dia Internacional da Mulher. Berlim, uma das cidades mais cosmopolitas do Mundo (se não a mais), é a primeira a decretar feriado desde o ano passado, nesta data tão especial.

Mulheres marchando por seus direitos em 19/03/1911

A mulher alemã hoje é sujeita de direitos iguais aos homens, amparada, inclusive, pela Constituição (Verfassung), no art. 3. 2 da Grundgesetz (nome da Constituição alemã) no capítulo dos Direitos Fundamentais (Grundrechte- Art. 1 ao 19) desde 1949. Um exemplo de força, independência e coragem. Mas infelizmente nem sempre foi assim, mesmo para a mulher alemã em especial a berlinense.

Assim como no Brasil e em outras partes do mundo, a partir de 1848, houve muitas lutas para entrar na Universidade, pelo mercado e trabalho (Arbeitsmarkt) e pelo Direito de Sufrágio (Frauenwahlrecht 1911), impulsionados pelas ideias socialistas que cresciam no mundo. Nomes como Lina Morgenstern, Pauline Staegemann e Clara Zetkin, foram fundamentais para esta luta. Dia 19/03/1911, foi o primeiro dia Internacional da mulher, com direito a manifestação das berlinenses (Frauendemostrationzug).

Autora do Artigo, a Advogada, Drª Ana Luíza Policani Freitas

Mesmo após tais conquistas, as mulheres ainda eram subordinadas aos grupos políticos e aos maridos. Tal situação mudou um pouco com o fim da Primeira Grande Guerra e a chegada da grande crise, a qual as mulheres casadas, foram “liberadas” para profissões femininas (secretária, vendedora, datilógrafa) com salário abaixo do mínimo, o qual foi motivo de luta pelo partido USPD, por direitos trabalhistas iguais e igualdade salarial. 

A partir de 1921 as mulheres comunistas começaram a comemorar o Dia Internacional da Mulher no dia 8 de Março, devido  a greve dos Trabalhadores têxteis em São Petersburgo – Rússia - na Revolução de 1917, e assim é comemorado até hoje.

Infelizmente houve retrocesso com o Nazismo no poder. As mulheres perderem seus direitos. O slogan foi “Schlaftzimmer sauber machen”! (vá limpar o quarto!) e esta data se tornou Dia das Mães, cuja função era cuidar da casa e dos filhos.

Anos de luta até as mulheres solidificarem suas conquistas

Com a fim da Segunda Guerra e do Estado Nazista, após a Conferência Yalta e Potsdam, as mulheres tiveram seus direitos e igualdade positivados na Constituição da Alemanha Ocidental (BDR- Bundesrepublik Deutschland) de Grundgesetz permitindo que as mulheres disponham do seu próprio dinheiro (1958) e que possam trabalhar sem a permissão dos maridos, assim como não a aplicação do Princípio da Parceria, a qual não há divisão fixa do trabalho no casamento (1977). 

Na antiga Alemanha Oriental (DDR - Deutsch Demokratische Republik), a igualdade era uma questão política precoce, pois fazia parte da ideologia de um Estado socialista. Apesar de ter sido uma ditadura, a plena igualdade entre homens e mulheres (Gleichberechtigung) foi estabelecida por lei e a proporção das mulheres que trabalham, na época, era uma das mais altas do mundo. Isso gerou um duplo fardo. O que conhecemos hoje como “dupla Jornada” e o que gerou uma baixa natalidade. Em resposta, o Estado fornece uma ajuda de custo para a famílias com mais filhos, para as mães poderem ficar em casa por mais tempo (algo parecido acontece hoje. Todas as famílias, inclusive as estrangeiras, com filhos, tem direito ao Kindergeld. Quanto mais filhos, maior o valor do Kindergeld). 

Em ambas as Alemanhas o Dia Internacional da Mulher era comemorado em 8 de março, data oficializada pela ONU em 1975, junto aos calendários internacionais. 

Após a reunificação das Alemanhas (Wiedervereinigung), as mulheres também se uniram. Lutaram pela manutenção dos seus direitos. As mulheres da antiga DDR foram as mais afetadas: suas qualificações desvalorizadas e as que tinham filhos tiveram dificuldade de arrumar emprego. E as instalações de assistência à infância foi reduzida, assim como os subsídios do governo para projetos femininos foram cancelados. 

Somente em 2013 foi estabelecido o direito dos pais a reivindicar a creche (Kita/ Krippe) e o Kindergarten (jardim da infância ) a partir dos 3 anos.

Cartaz visto por Berlim, destacando o Feriado de 8 de Março, celebrando o Dia Internacional das Mulheres

Um debate sobre o feriado público começou em Berlim, no final de 2017: rede “Women in Neukölln”, que inclui mais de sessenta projetos de mulheres, e decidiu chamar (fazer) do dia 8 de março o novo feriado público de Berlim. Eles escreveram uma carta aberta aos grupos parlamentares da Câmara dos Deputados de Berlim, que foi apoiada por várias outras redes de mulheres de Berlim. Um feriado para todas independente de origem, cultura e religião. Aprovado em janeiro de 2019 com o objetivo de comemorar as longas lutas das mulheres por participação e igualdade social, com base no art. 10.3 da Constituição alemã (Grundgesetz) “die Gleichstellung und die gleichberechtigte Teilhabe von Frauen und Männern auf allen Gebieten des gesellschaftlichen Lebens herzustellen und zu sichern” (“criar igualdade e participação igual de mulheres e homens em todas as áreas da vida social”). 

Apesar de tantas conquistas, a pergunta que não quer calar: Existe violência doméstica na Alemanha? Em Berlim? Sim existe. E muita. Entretanto as vítimas (alemãs ou estrangeiras) possuem um grande suporte do Estado alemão como um lugar sigiloso para morar (Frauenhaus) com seus filhos, psicólogo, ajuda financeira, bilhete de passagem na procura de emprego e do seu apartamento (o Estado paga parte do aluguel). Em breve sairá um artigo abordando mais detalhes procedimentais e jurídicos sobre o assunto.

Importante ressaltar no tema abordado que com tais conquistas, a educação familiar mudou. A atual família alemã já educa suas crianças para igualdade e respeito uns aos outros, inclusive na divisão de tarefas domésticas (todos ajudam). Isso é reforçado inclusive nas escolas e universidades. Talvez seja essa a grande diferença no Brasil.

A educação familiar é fundamental para que tais direitos sejam reconhecidos, especialmente pelas futuras gerações. Infelizmente, no Brasil, ainda temos resquícios de desigualdade, amparadas pelas famílias mais tradicionais e instituições religiosas. E isso está no dia-a-dia, quando a menina é obrigada a saber/fazer serviços domésticos, enquanto seu irmão está sentado na poltrona, assistindo o programa esportivo. Quando ela ganha uma boneca e panelas, e seu irmão videogame. Quando a família comemora a conquista de uma vaga na universidade fora do Estado ou País de um parente homem e se acontecesse com a mulher ou, ela não poderia ir, ou deveria ter a “aprovação da família”. E até mesmo colocada sua competência E moral em xeque.

Em Março Berlim exalta as mulheres

A mulher alemã é criada para ser independente, em especial a berlinense. Ela sabe o que quer. O que vestir, desde o short curto, a roupa longa e não é questionada, nem sequer desrespeitada, no transporte público. Convive com mulheres de outras culturas e as respeita. Não é questão de postura fria, mas de autoridade (eu posso, eu faço, eu vou e não estou preocupada com opiniões alheias). Com isso ela é avaliada, não pelo que veste e o grupo social seguido, mas por sua competência, independente da idade. 

Importante ressaltar ao povo brasileiro que todas nós somos humanas, sujeitas de direitos, deveres e personalidade própria, assim como todos. Da mesma forma que as alemãs, somos amparadas pela Constituição. Está no art. 5º. I da CRFB, como um Direito e Garantia Fundamental sempre buscando nosso espaço. 

Por fim, neste mês especial, desejo a todas as brasileiras a determinação e a independência da mulher alemã. Nós não devemos prestações de contas a ninguém, a não ser a nós mesmas. Muita força e coragem para continuar a lutar pelos seus direitos, seu espaço e seus sonhos!

 

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